sábado, agosto 19, 2006

Mingau 2003 ~ 2006

"[...]

Se eu morrer muito novo, oiçam isto:
Nunca fui senão uma criança que brincava.
Fui gentio como o sol e a água,
De uma religião universal que só os homens não têm.
Fui feliz porque não pedi cousa nenhuma,
Nem procurei achar nada,
Nem achei que houvesse mais explicação
Que a palavra explicação não ter sentido nenhum.

Não desejei senão estar ao sol ou à chuva -
Ao sol quando havia sol
E à chuva quando estava chovendo
(E nunca a outra cousa),
Sentir calor e frio e vento,
E não ir mais longe."

Alberto Caeiro, 7-11-1915

:'(

6 comentários:

Sandman disse...

Morreu.

Era branco como uma nuvem. Fofo como um urso de pelúcia.

E morreu.

Anónimo disse...

:( Lamento...

Patrícia disse...

Estou sem tempo para ler os teus posts novos, Sandman (por este blog, recuso-me passar a correr. Adoro ler-te), mas não posso deixar de te dizer algo em relação ao Mingau.

Já perdi muitos amigos como o Mingau. Amo os animais em geral, os mamíferos em particular, mas os gatos... os gatos são seres sobre os quais poderia falar e escrever sem fim à vista. Um pouco como o que acontece quando me sento a observá-los. Perco a noção do tempo.

A minha família teme que eu endoideça e acabe como aquelas velhinhas que moram em apartamentos exíguos com 74 gatos e uma reforma de 100€. Tudo porque tenho uma capacidade de me apaixonar à primeira vista por qualquer gato doente, com fome ou às portas da morte por falta da mãe que o amamente, que já adoptei uns quantos. Neste momento, vivem cá em casa 3 gatos que não se dão entre si (é um verdadeiro pandemónio) e, nas traseiras da casa, tentei acomodar o melhor que pude, com cobertores, uma gatinha pequena e doce que decidiu que quer viver nesta casa (foge da dona que lhe arranjei) e, para "ajudar", teve 3 filhotes lindíssimos. Ou seja, já são 7 gatos. Todos os dias ouço que eles não podem ficar cá e tenho de lhes arranjar dono. E todos os dias sinto que estou mais e mais embevecida por aquelas três bolinhas de pêlo.

Ups, desviei-me do propósito do comentário. Perdão. Retomá-lo-ei no parágrafo seguinte.

Lido com gatos há pouco mais de 10 anos, mas eles têm-me ensinado imenso. São parecidíssimos connosco. Apenas numa versão sem artifícios nem mentiras. Cada um tem a sua personalidade bem definida, sabe bem do que gosta e do que não gosta, quando lhe apetece zangar-se, quando nos quer demonstrar afecto e quando tem vontade de receber uma sessão de mimo. Sei bem o quanto custa perder alguém tão genuíno. Mas sabes, Sandman? Tenho a certeza de que, tal como o ser humano, cada gato tem uma espécie de "missão de vida". A missão do Mingau, só tu a deves conhecer. E tenho a certeza de que a cumpriu.

Não feches o teu coração ao amor de outros gatos. Nunca podendo substituir o Mingau, eles vão sempre ensinar-te e dar-te o que nenhum humano é capaz.

Beijo

Sandman disse...

Ias adorar a minha rua, tenho uma vizinha no primeiro andar que adopta todos os gatos vadios que pr cá deambulam, e que depois formam verdadeiros acampamentos no passeio. Não os mete em casa, que o marido deve reclamar, mas deixa sempre umas tigelinhas com comida cá fora.

Os gatos, esses, preferem viver na casa em frente, que está abandonada e tem um pequeno jardim onde os filhotes podem brincar enquanto os pais se refastelam no meio das ervas. São quase todos pretos, curiosamente, e já consegui fazer amizade com 3 (os que não são tão ariscos), que acorrem prontamente aos meus chamados. A vizinha dá-lhes comida, eu dou-lhes carinho. Ouvi-lhe hoje que em Novembro a casa vai ter obras, para ficar pronta a habitar, não sei como será com os bichinhos, o que vale é que eles desenrascam-se sempre. Se pudesse trazia um para aqui, mas não posso.

O Mingau era um gato branco que uma amiga da faculdade me ofereceu, 3 anos atrás. Foi amor à primeira vista, ver aquela bolinha de pelo a caminhar hesitante, completamente branco, parecia um tufo de algodão.

Ofereci-o à mina sobrinha, que tinha 10 anos na altura. Já andava com vontade de lhe dar um bichinho há algum tempo, acho que faz bem às crianças, e como ela passava muito tempo sozinha com o computador, em casa (enquanto a mãe trabalhava), um gatinho era a solução ideal. A minha irmão fartava-se de dizer que não queria gatos.

Levei-o numa noite de sexta feira para Viseu, dentro de uma caixa de sapatos, a arregalar os olhos para tantas luzes, quieto como um rato (curiosa expressão para um gato, hum?). Acordei-a quando cheguei, e foi questão de segundo até ela se apaixonar também por aquela coisinha branca que caminhava a medo pelo quintal. No dia seguinte bastou também um olhar e a minha irmã ficou conquistada; o raio do bicho era mesmo bonito.

Cresceu, e continuou lindo. Pachorrento, com um miar esquisito, grave, a arranhar a garganta. Meigo como poucos gatos que vi, de uma meiguice e indolência extraordinárias. Era especial.

Na semana passada ficou doente, a andar devagar pelos cantos, cabisbaixo, e foi levado a veterinário: um virus. Tentou-se um tratamento, ficou alguns dias no veterinário, mas só piorou. Tiveram que o abater para lhe poupar maiores sofrimentos.

Agora sei que está num sítio melhor, talvez a fazer companhia á minha cadela Jarbas, da infância, mas ficamos todos inconsoláveis. Especialmente as minhas sobrinhas. E a minha irmã. E eu.

É muito triste isto, sabes. Muito triste. Não sei se lhe quero arranjar outro gato, tenho medo que aconteça o mesmo. Mas, por outro lado, acontece o que tiver de acontecer. Ainda assim não vou arranjar, não tenho coragem, por enquanto. Talvez no futuro, quando for viver para uma casa só minha. Quem sabe um cão e um gato, criados juntos desde pequeninos.

Obrigado pelas tuas palavras, não sabes o quanto significaram para mim. As pessoas dizem que "é só um gato", mas ambos sabemos que era muito mais do que isso.

E sabendo, nunca mais o esqueço.

Beijos

marta, a menina do blog disse...

Os gatos têm 9 vidas e vivem por 10. Nós é que somos demasiado limitados para o compreender.
Lá no lugar onde estão, só lhes deve apetecer abanar-nos pelos ombros como se tivessemos uma aranha gorda e peluda no cabelo e gritar "NÃO PERCEBES??". Ou, se calhar, nem isso. Os gatos são muito senhores de si próprios...

Patrícia disse...

Nunca te aconteceu saber de alguém que perdeu o marido, a namorada, um filho, e nunca mais se casou, namorou ou teve filhos, mas viveu décadas de infelicidade amargurada e crescente? Não achaste que teria sido muito melhor se essa pessoa tivesse aberto o coração e deitado as correntes e a fechadura ao lixo? Não se substituem entes queridos cujo corpo deixa de viver, é certo. Mas quem continua vivo, precisa de amar e ser amado. Precisa de continuar a viver. A sobrevivência não é nem nunca foi suficiente. Cada pessoa é diferente e não vai fazer lembrar quem um dia esteve no seu lugar. Isto é válido para os gatos, também. A missão de um gato é muito mais curta do que a de um ser humano. Eles não erram, não agem por vilania, não possuem crueldade. Eles não enganam, não mentem, não roubam. Eles não sabem quando estão a prejudicar alguém. Não têm "lições" de vida para aprender e evoluir. Não devem nada a ninguém.

Beijo